quarta-feira, 13 de junho de 2012

Sensitividade




Por: José Ricardo



Deus no céu e a polícia na terra. É assim que muitos pensam. Chamam a polícia para tudo. O que dois policiais podiam fazer num hospital para atender uma solicitação dando conta que uma mulher chegara dizendo que ouvia vozes e que precisava de ajuda? Nada.


Policiais não são psiquiatras. Mas foram chamados...

- Sargento, essa mulher chegou aqui dizendo que está ouvindo vozes de um tal de Muriel. Ela conversa com ele como se ele estivesse ao lado dela. Olha pra você ver - disse a atendente do hospital.

De fato, a mulher falava e gesticulava com exaltação, conversando com um ser imaginário a quem ela chamava de Muriel.



- Olha, Muriel, têm dois policias aqui. Não deixa eles me prenderem, não, Muriel.

- Senhora - disse o Sargento Mike -, nós não viemos aqui para te prender, não. Nós viemos aqui para lhe ajudar. Por que a senhora chegou ao hospital correndo?

- Foi o Muriel que mandou.

- Quem é o Muriel?

- Ele é o diretor da escola onde eu trabalho. Eu sou professora. O Muriel é sensitivo. A gente conversa por telepatia. Ele está me testando.

O Sargento Mike não entendia nada de sensitividade, mas respeitava todo tipo de credo.

O Sargento virou-se para a atendente do hospital.

- A gente não pode fazer nada por ela, não.

- Mas ela chegou dizendo que estava sendo perseguida por algumas pessoas...

- Mas tudo isso é na cabeça dela.

- Sargento, eu chamei o médico. Espera só ele chegar.

- Eu acho que ela vai ter que tomar alguns remédios para ficar mais calma.

- O médico também acredita em sensitividade. Ele disse que vai orar por ela.

O médico chegou com uma bíblia na mão. Cumprimentou os policiais e aproximou-se da mulher.

- Como a senhora chama? - ele a perguntou.

- Mary Sabich. Eu sou professora.

- Ah... Mary Sabich... Mary, vamos orar um pouquinho?

- Vamos, doutor. O Muriel tá dizendo que é para eu orar com o senhor.

O médico abriu a bíblia e leu o salmo 91 duas vezes para a mulher, mas ela o interrompia a todo momento.

Mike percebeu que o médico não estava tendo sucesso.

- Doutor, parece que será preciso medicá-la.

- Eu vou ler só mais um salmo para ela. O problema dela é espiritual. Ela precisa de oração.

Salmo 23. O senhor é meu pastor, nada me faltará... Ao ser interrompido novamente, o médico desistiu.

- É, sargento, ela precisa de oração, mas vamos aplicar uma injeçãozinha pra ela ficar mais calma. Você dois podem ajudar a gente? Talvez seja preciso segurá-la.

- Sim, doutor.

Mike e o Soldado Brucis eram policiais comunitários, por assim dizer. Não podiam negar o pedido do médico.

A mulher não queria tomar a injeção. Mike pensou num modo de convencê-la. Pegou o celular e apertou algumas teclas aleatoriamente. Depois, na presença dela, falou:

- Alô, é o Muriel? Oi, Muriel, é o Sargento Mike quem está falando. Tudo beleza? É o seguinte, a Mary Sabich precisa tomar uma injeção para ficar mais calma. Ela disse que só vai tomar a injeção se você deixar. Ela pode tomar? Pode, né. Então eu vou falar com ela que você disse para ela tomar injeção. Obrigado, Muriel.

O Soldado Brucis falou com o sargento:

- Bem que a psicóloga falou que o senhor é doido.

- Com direito a laudo psicológico de doidura e tudo.

Olhando para a mulher, Mike disse:

- É, Mary Sabich, Muriel falou que você tem que tomar a injeção.

- O Muriel falou? Então, tá bom. Eu vou tomar então.

Depois de alguns minutos tentando convencer a mulher a se deitar na cama para tomar a injeção, que seria aplicada na veia, ela disse:

- Eu só vou tomar se o Sargento Mike aplicar a injeção em mim.

E não é que o médico teve a audácia de perguntar:

- Sargento, você sabe aplicar injeção?

- Sei não. Doutor, vamos ter que segurá-la mesmo - esquivou-se Mike.

Quando a mulher percebeu a disposição no uso da força, apenas obedeceu ao médico.

Trinta segundos depois de ter sido aplicada a injeção, ela ficou sonolenta e não ouviu mais voz nenhuma. Ocorrência resolvida, o doido do Sargento Mike e o Soldado Brucis voltaram ao patrulhamento normal.



Nota: Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, fatos e lugares são frutos da imaginação do autor e usados de modo fictício. Qualquer semelhança com fatos reais ou qualquer pessoa, viva ou morta, é mera coincidência.



"É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” - Inciso IX do artigo 5º da Constituição Federal.

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