quarta-feira, 11 de julho de 2012

O dia seguinte



Por: Helder Andrade Anastácio, SdPM



Éramos muitos neófitos, reunidos em um lugar amplo, bonito e confortável.

Alguns de nós já tinham servido em forças de segurança, mas confesso que, para mim, era uma experiência completamente nova a Polícia Militar, uma decisão arriscada que tomei, contrariando expectativas e sonhos familiares, arriscando também tempo e dinheiro em um processo seletivo que sequer imaginava estar ingressando um ano e meio antes.

Eu estava ali pensando em tudo o que poderia ser esta nova etapa, de bom e de ruim. Desejoso, vibrante, mas um pouco temeroso do que não conhecia, como é natural temermos o desconhecido.



Imagino que o leitor deve estar pensando que esse era o primeiro dia. Não era. Era o segundo. E eu tinha ouvido tantas coisas desde o dia da matrícula, glorificando, exaltando, que estava em dúvida sobre o que era verdade ou não em tudo aquilo que estava vivendo. Nesse novo dia, haveria mais palestras, e eu já percebia que seriam enfocadas informações sobre a corporação, devido ao assunto da palestra principal da manhã. Para mim, isso era ótimo, pois um dos motivos que me fizeram ingressar na corporação é que já era um entusiasta em assuntos relacionados à corporação e à Segurança Pública. Diferente de muitos naquele lugar, eu não estava entediado ou dormindo; é verdade que dava algumas “voadas”, contudo entendia o que vinha sendo falado. Anunciaram que haveria uma palestra de uma alta funcionária, com histórico e currículo profissional invejáveis. Na verdade, até aquele momento, ainda não estava impressionado; estava ainda um pouco em dúvida sobre o que realmente era aquela nova vida.



Mas, quando começou, eu vi uma palestra boa, dinâmica, bem explicada e com recursos de multimídia bem utilizados. Todavia, o que mais destacou não foram essas questões técnicas, que são vistas em várias outras palestras por todo o Brasil.



Em certa altura, a palestrante declamou um poema e foi, em alguns poucos momentos, não nas palavras lidas, mas na voz trêmula, na respiração dificultosa, no rubor da face, nas lágrimas que vieram dela, naquele arrepio que senti e no aplauso sincero e vigoroso que veio de toda a plateia que a assistia é que relembrei porque mais de um ano antes havia feito minha inscrição e escondido de minha família porque saí tão cedo em um domingo de manhã.


Talvez, daqui um tempo, estarei a pensar sobre minha frustração, sobre o erro que cometi. Mas o que me moveu um ano antes e me move hoje é só uma coisa: Saber por que apesar de tanto rigor na formação, tantos riscos na profissão, de salários baixos, estes homens e mulheres não gostam, não são apaixonados, mas sentem algo que não se ouve falar em nenhuma outra profissão: Eles vibram pelo que fazem.



Ps.: Nem o sol quente nem a chuva e vento frios no final daquela mesma tarde abalaram nossa Companhia na ordem unida e no fora de forma. Se foi empolgação inicial ou verdadeira vibração, só saberemos com mais algum tempo.



* Nota: Recebi este texto do Soldado Aluno Helder Andrade Anastácio. Como não há ofensas nem críticas, resolvi publicar, até porque o texto é de excelente qualidade e traduz o que sente o policial em seus primeiros dias na caserna. No e-mail, o soldado me disse: "Você pode estar pensando que ainda é muito cedo para alguém que foi incorporado há apenas 3 dias escrever sobre a corporação, mas preferi escrever enquanto minhas idéias estão frescas, os sentimentos estão novos. Se fosse escrever ou revisá-lo depois, certamente distorceria as idéias e emoções que estão nele hoje. E o objetivo é este: mostrar a visão deste indivíduo que acaba de entrar na corporação e, com certeza, há várias outras visões."



Diário de PM/BM

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