sexta-feira, 29 de março de 2013

Acerto de contas (O Diabo Fuma Charuto)



-          O que você faz aqui?

-          Boa pergunta. Eu também gostaria de saber que diabos eu faço aqui.

-          Diabo. Um só. Único. Autêntico. Eterno. Um só.



-          Tá. Vai se fuder então e me diz logo que porra eu faço aqui.

-          Vejamos. Primeiro, eu gostaria de saber qual foi à porra que você fez para parar aqui. Você não tem cara nem tipo do povinho que vem para cá. Mas, porém, no entanto, data vênia, se está aqui é porque o brother não te quis. E, se o brother não te quis, você deve ter sido muito mauzinho.

-          Por que você não vai enrolar o cu da tua mãe e me diz logo?

-          Não falei? Menino desbocado. Façamos o seguinte, comece me contando sua vida.

-          Pra quê? Fará diferença?

-          Quem sabe?

-          É o seguinte, Mané. Ou tu para de enrolar ou a porrada vai comer legal aqui. Tá pensando que tá falando com quem?

-          Acho que você não está nem em condições, nem em posição de exigir nada.

-          Ah tá. E tu? Vai fazer o quê? Vai me matar? Já to morto, seu viado. Ou tu tá pensando que esse rombo no meu peito é tatuagem? Vai se fuder, caralho.

-          Te matar não posso. Mas transformar tua passagem por aqui numa experiência desagradável, isso eu posso.

-          Desagradável é a visão do cu cabeludo da tua mãe, seu puto. Desagradável é passar mais de vinte anos caçando vagabundo, ouvindo oficiais viados arrotarem ordens absurdas e usurpar o dinheiro público na maior cara de pau. Desagradável é chegar em casa e nem uma puta ceva gelada na geladeira para aliviar o calor. Desagradável é ver um bando de filhos da puta metidos a rico e juiz de direito ameaçando te processar por causa de uma multa de trânsito. Desagradável, seu viado, é levar um par de guampa, se bem que você não deve se importar, e ver a mulher que você ama indo embora com outro. Tá bom assim ou quer mais?

-          Então o menino mauzinho era policial?

-          Não, era o comedor da tua mãe.

-          Típico. Acompanhei teus passos. E quer saber? Eu sabia que cedo ou tarde iríamos nos encontrar. Não era você que sempre dizia que queria vir para cá? Não era isso que falava para aqueles coitados quando você os quebrava a pau? O que eu quero realmente saber, é como você veio parar aqui.

-          Uma trepada.

-          O quê?

-          Você é surdo ou não lavou os chifres hoje? Uma trepada, fornicada, tico na xeca, bimbada. Aquilo que a puta da tua mãe adora fazer. Quer que eu desenhe?

-           Engraçadinho. Me conte, como foi?

-          Tá. Já vi que o rabudinho não vai desistir. Então tá. É o seguinte. Conheci a mulher de um colega e começamos a sair. Trepar, para ser mais exato. Isso durou uns seis meses. Um belo dia ela resolveu contar tudo para ele. A casa caiu. Eu sumi por uns tempos. Mais de ano depois, ele me ligou, a pedido dela. Me falou um monte de coisas sobre perdão e bla bla bla que não me convenceu muito. Sumi novamente. Anos mais tarde, por coincidência do destino. Tá rindo do quê? Vai me dizer que tem dedo teu nessa parada?

-          Capaz. Continua. Apenas achei engraçado.

-          Engraçada é a vaca gorda da tua mãe de quatro, balançando as pelancas e pedindo tapa na bunda.

-          Continua.

-          Não gostou né? Não te preocupa, não comi a baranga da tua mãe, nem que ela me pagasse. Pois bem, continuando. Encontramos-nos anos mais tarde em um shopping. Conversamos um tempo e ele me convidou para ir até a casa deles. Disse que o que passou já era e que queria manter a amizade e bla bla bla. Não sei o que me deu na cabeça. Aceitei.

Um belo dia apareci na casa deles. Mesmo desconfiado. Receberam-me hiper bem. Almoçamos, passeamos num parque pela tarde. Acabei jantando com eles. Como estava ficando tarde anunciei que iria embora. Foi quando ele me disse que iria trabalhar no plantão da madrugada e pediu para que eu dormisse lá, pois estava tarde e a estrada de volta para minha cidade era perigosa. Estranhei demais aquela atitude. Resolvi dar o fora.

Quando a esmola é demais, se desconfia do santo. Você deve saber muito bem como é isso. Eles insistiram e eu relutei. Menti que tinha um encontro com uma mina e etecétera. Ele insistiu novamente com o apoio dela, dizendo que pela manhã poderíamos continuar a conversa e os passeios que estavam agradáveis. Agradeci o convite e me despedi. Subi na minha moto e saí dali.

Mas você sabe muito bem que a carne é fraca, ainda mais quando a presa está diante dos seus olhos pedindo para se comida. Dei a volta na quadra, deixei a moto numa garagem de aluguel e fiquei esperando ele sair. Passamos a noite toda trepando feito animais no cio enquanto o corno trabalhava.

A merda foi que peguei no sono. Acordei com o barulho do carro do guampa entrando no pátio. Meio sonolento ainda, catei minhas roupas e pulei a janela. Não queria ficar para ver a reação. Pulei o muro vizinho e dei de cara com um cachorro cuja raça não sei qual é, pois só vi aqueles dentes enormes vindo para meu lado. Pulei o outro muro e o outro e o outro. Foi quando uma viatura passava pela rua e uma velha que deveria ser a puta da tua mãe gritou a todo pulmão - Pega ladrão! - Fudeu.

E cá estou eu, com esse rombo no peito. Satisfeito? Agora pode me dizer que diabo eu faço aqui?

-          Posso dizer que estou em partes. O que você faz aqui? Não se preocupe, o limbo serve para isso mesmo. Ou você pensa que tudo o que você fez vai ficar no zero a zero?

-          Vai se fuder seu corno chifrudo.

 

Por Roberyk



Diário de PM/BM

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