Então, de repente, o motor do Palio 2007 preto que
dirigia morre. Gelei, e tudo o que consegui pensar e dizer naquele momento se
resumia em apenas uma palavra:
- Fudeu.
Logo a frente, naquela entrada da favela onde
tentava entrar discretamente, começo a ver figuras negras moverem-se
apressadamente para ambos os lados da rua, buscando abrigo. Não são suas
silhuetas que me assustam, mas a silhueta do que teem na mão.
Giro apressado o chave na ignição. Ronca, liga, mas
morre em seguida, enquanto as sombras começam a avançar mais rapidamente em
minha direção.
- Porra! Funciona, cacete!
- Apaga o farol, filho da puta!
Obedeci. Em instantes, o carro está cercado. Mais
fuzis do que consigo contar estavam, neste momento, apontados para mim.
"Deus, por favor...".
Alguns traficantes abaixam e olham pra mim e pra
dentro do carro, sem falar nada. Então o que possuia um M16 e usava um boné da
Adidas, falou, sem mover o fuzil da minha direção.
- Qual foi, porra?! Tá maluco?! Como é que tu chega
nessa porra com o farol alto? Quer levar chumbo, caralho?!
- Foi mal, irmão, foi mal mesmo... O carro só
morreu e esqueci de apagar o farol, foi mal mesmo.
Luto pra manter o autocontrole. Ao ouvir isso,
percebendo (uma falsa) inocência na minha voz, o vagabundo abaixou o M16, ainda
com cara de puto. Os outros abaixam também. Achei o "chefe". Ei, é
"ele". Sim.
Outro marginal (menor, com certeza), do meu lado
direito, faz a pergunta crítica:
- Tu mora onde, mané?
Penso rápido.
- Ah, que isso?! Num tão me reconhecendo não? Sou
'cria', porra. Cresci la na Cova do Tatu (nome fictício), pô, mas agora tô com
a minha tia em São Paulo. - Viro na direção do gerente. Não tenho que dá
satisfação pra "bucha", mas pra ele - Só vim ver minha mãe, irmão.
Ele pára por um instante, olha pra mim e para o
carro de novo.
- Já é, já é. Vai lá, se adianta. Mas pelo amor de
Deus, num faz isso de novo não, caralho!
- Valeu, valeu irmão, foi mal mesmo...
Com isso, os vagabundo se afastam do carro. Já
ligado, avancei. Acenei uma última vez para o gerente, dei uma piscadinha no
farol, e segui favela a dentro.
Minhas mãos suavam e tremiam. Ainda assim, peguei o
celular. Quando ele atendeu, disse, no viva voz, quase não movendo os lábios e
ainda muito discretamente:
- Achei o Playmobil. Tá aqui. Inicia a operação, e
pede apoio aéreo da Civil. Vou esperar no Tatu o "três-meia-zero".
Trás meu fuzil.
Vim encontrar um alvo, e quase vou pro micro-ondas.
Mas não estava acabado. Ia ter que ir mesmo até a Cova do Tatu (sorte que
estudei bem a área), pois os vagabundos me "escoltariam" via rádio,
pra saber se dizia a verdade.
Conheço como esses filhos da puta agem, achei meu
alvo e não pretendo morrer hoje.
Porra... Inteligência não é função para os fracos
não.
Por: Persival.
Diário de PM/BM
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