- Bate! Pode bater. Mas bata como
homem. É só isso que consegue? Minha cadelinha bate mais forte.
Cuspi uma bola de sangue após o
quinto soco na boca. A essa altura do campeonato eu já estava amortecido de
tanta porrada e já não tinha expectativas de sair ileso.
Se tivesse um mínimo de sorte, sairia
vivo, o que seria um lucro enorme diante da situação. Eles eram quatro, se
fossem três eu até daria conta, mas quatro é covardia. O jeito era esperar o
momento certo e aguentar o máximo possível aquelas porradas.
**
Sempre fui osso duro demais para roer
e absorvia os socos de um jeito que irritava qualquer um. Devo agradecer às
inúmeras brigas travadas nos tempos de colégio, onde começou minha fama de Iron
Man e que se estendeu pela adolescência nas noites em que sempre tinha um filho
da puta corneado para puxar briga.
É, fui moldado assim, no meio da
violência, na luta por território e pela afirmação como macho. Nunca fui de
procurar encrenca, mas nunca fugi de uma. O sempre foi o Secão, meu amigo de
infância e parceiro de muitas aventuras urbanas, que sempre foi um para-raios
que atraía os olhares dos mais variados vagabundos, geralmente quando ele dava
uns pegas nas mulheres dos outros caras. Teve até uma vez que fomos levar umas
putas para casa e na volta um desmiolado desembestou de querer brigar, do nada.
Logicamente que a porrada comeu frouxa.
Quando conseguimos uma 7.62 a coisa
piorou, para os outros é claro. Geralmente a pistola ficava comigo, como último
recurso, quando o diálogo se dava com paus, pedras, porretes, facas e facões.
Nunca pensei duas vezes ao atirar. A parte mais linda era ver os bonecos
queimando sola tentando fugir.
O troço todo parou, em partes, quando
entrei para a polícia. A pancadaria assumia proporções um pouco maiores e o
pipoco era mais violento.
**
A porrada na orelha doeu. Essa doeu
pra caralho. Olhei para o grandão e sorri.
- A bicha tá perdendo a força? Tua
mulher tem a mão mais pesada.
Mais um soco atingiu minha têmpora.
Vi estrelas. O grandalhão babava feito um Pitt Bull. Estava descontrolado, do
jeito que eu queria. Um homem com raiva não sabe bater, deixa a testosterona
tomar lugar dos neurônios. Desses nunca tive medo.
- Se a biba me soltar eu posso
ensinar como é que um macho bate. Aposto que você gosta de levar tapinha na bunda
quando tá dando o rabo.
Mais um soco que atingiu a cabeça.
Notei que o grandalhão estava cada vez mais fora de controle e já não desferia
s golpes como antes. Um cara desses não saberia nem bater um punheta direito.
Porrada tem que ser calculada, tem que ser como o “caminho para a redenção”,
meu mais perfeito tapa, o que derruba, o que humilha qualquer vagabundo. Por
isso me chamam de Conde, Vlad ou Vamp, apelido dado por um colega após
presenciar um desses tapas que deixou o vago desmaiado por cinco minutos com a
boca cheia de sangue.
Você pode quebrar um homem a
pauladas, a socos, chutes. Um tapa na cara dói mais que qualquer coisa. Fere a
masculinidade, humilha, faz a pessoa se sentir rebaixada, indefesa.
Os outros três apenas observavam.
Calculei que tinham ordens expressas que deveriam cumprir à risca. O primeiro
estava cuidando o movimento pela janela do porão. O segundo vigiava a porta. O
terceiro estava no lado de fora e o grandalhão fazia o serviço. Todos usavam
capuz para não serem reconhecidos. O que os putos esqueceram, e isso é coisa de
vagabundinho barato, foi de esconder as tatuagens vagabundas de vagabundo
vileiro nos braços.
De uma coisa eu tinha certeza. Não me
queriam morto. Aquilo era um aviso. Um recadinho de traficantezinho viado dessa
porra de cidadezinha. Maldita hora em que fui comprar cigarro e cerveja. Eu
deveria ter desconfiado do Opala preto parado na esquina do posto de
combustível. Vacilo mesmo.
**
Bonita foi a noite em que deixei o
desenho de um 38 na cara de um vagabundo da Castelarin. Na época eu já estava
na polícia e era solteiro. Meu irmão havia viajado com a noiva e eu estava com
a casa toda só para mim. Não pensei duas vezes e chamei o Secão, o Bêlo e o Pompeo
para a noitada. A boate ficava pertinho de casa, apenas duas quadras de
distância. Naquela época eu andava com um oitão inox de duas polegadas, cano
reforçado, uma joia. Fomos para a boate e arrumamos umas putas para levarmos
para a minha casa. Tive o cuidado de tirar a munição do teco para evitar
acidente. Muita gente na casa, muito álcool, muita farra.
O Secão foi para um quarto com uma
garota e eu fui para outro. O Pompeo e o Bêlo ficaram para trás. Mal deu tempo
de começar a trepar quando o Pompeo chegou correndo falando que tinham batido
no Bêlo. Coloquei a primeira calça que vi na frente e passei a mão no oitão. O
Secão deu de mão num facão e fomos para a esquina.
**
Quando saí do posto, o Opala não
estava mais na esquina. Não me preocupei, ascendi um cigarro e saí caminhando
pela avenida. Minha casa ficava duas ruas acima. Notei que um carro descia com
os faróis em luz alta. Baixei os olhos para evitar o ofuscamento. Só deu tempo
de ouvir o barulho da freada e acordar amarrado nessa cadeira.
- Tu anda fuçando onde não deve.
- Sério? Não sabia que a vadia que me
chupou era tua mulher.
Outro bofete, dessa vez ele usou a
mão esquerda.
- Tua sorte é que o chefe não deu
ordem para te matar. Mas fica avisado.
- Estou morrendo de medo. Faz um favor?
Tenta fazer uma voz de macho. Fica feio uma bicha do teu tamanho falando
fininho.
O soco na costela me tirou o ar.
Quando recobrei o fôlego, o magricelo do lado de fora entrou.
- Vamos abrir. O chefe ligou e mandou
soltar esse puto no meio do mato.
**
Como eu disse, nunca procurei
encrenca, mas quando pintava uma, sai da frente meu filho, nunca tire um polaco
do sério. Chegamos à esquina e o Bêlo estava sentado numa escada, o olho
direito parecendo uma uva passa. Tinha uns três carinhas ao redor dele. Já
cheguei perguntando o que tava pegando ali. Um baixinho meio entroncado disse
que só falava com a polícia.
- Tudo bem. Eu sou da polícia cara. O
que tá rolando aí?
O nanico me olhou, de baixo para
cima, e tentou completar a argumentação:
- O que tu quer alemão de mer...
Antes de ele terminar a frase, minha
mão já descia em alta velocidade na direção de seu rosto. Deu para escutar o
osso da face quebrando quando o aço inox bateu. Nunca fui alemão, como disse,
sou polaco e tenho pavor de confusões geográficas.
O nanico rodopiou e caiu. Nesse
instante já se formava a maior pancadaria. Não sei de onde saiu tantos facões e
adagas. O Secão já estava dando estouros de facão no lombo de um. O Pompeo tava
saindo no braço com um carinha que tinha uma adaga na mão. A correria começou
para tudo quanto era lado. O nanico levantou do chão e me olhou com os olhos
esbugalhados que ficaram mais arregalados ainda quando apontei o oitão e disse:
- Agora tu vai morrer seu puto!
Ele e outro comparsa saíram correndo
em direção à boate enquanto o Pompeo corria atrás de outro no sentido
contrário. O Secão balançava o facão no ar e gritava para mim:
- Atira cara! Atira.
Eu parei no meio da rua. Levantei o
teco, mirei e puxei o gatilho.
**
Continua...
Por:
Roberyk
Diário
de PM/BM
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