quinta-feira, 14 de março de 2013

O policial compulsivamente pessimista




Há entre os policiais um tipo de comportamento pessimista quase patológico: qualquer momento em que se analise determinada medida ou acontecimento, este tipo de policial se dedica a negativar o objeto de análise, sempre se posicionando contrariamente, atuando como uma espécie de crítico ácido e voraz na deslegitimação da mudança proposta. Esta conduta é exercida como uma espécie de originalidade de pensamento e reflexão. Ser opositor, sempre, é o modo de estar sempre certo, já que em qualquer coisa pode ser indicada alguma falha e/ou inconsistência.
 

Alguns exemplos desse pessimismo compulsivo:

- Um policial é designado para realizar um curso no exterior

Crítica: “Foi designado porque é ‘peixe’. Provavelmente é parente ou amigo de algum chefe. O curso certamente não será aproveitado porque o interesse do policial designado é apenas as diárias que receberá da viagem. A polícia não ganhará nada com este curso”.

- Um policial de outra corporação é designado para realizar um curso no exterior

Crítica: “Como nossa polícia é atrasada! Enquanto outras corporações estão mandando seus policiais para se especializarem no exterior, nossa polícia continua dando passos de tartaruga, sem se preocupar com a formação dos seus homens”.

- O Policial é designado para realizar um curso

Crítica: “Só me mandaram fazer este curso para depois me obrigarem a fazer determinado tipo de serviço. Curso desnecessário, que não acrescenta nada à minha experiência profissional, muitos professores que falam sem conhecimento de causa. Seria melhor se tivesse quieto, em minha unidade”.

- Um policial comete um crime e é preso

Crítica: “Arbitrariedade, abuso, perseguição. Se fosse alguém ligado à chefia provavelmente não seria preso. O tratamento seria diferenciado”.

- O policial que cometeu o crime é solto

Crítica: “Foi solto porque é ‘peixe’. Provavelmente tem alguma ligação com a chefia, que agilizou o processo de soltura”.

- Novos equipamentos chegam em uma unidade

Crítica: “Prefiro trabalhar com o equipamento que tradicionalmente eu trabalho – não me dá dor de cabeça nem responsabilidade. Não quero correr o risco de me complicar com estas coisas”.

- Equipamentos demoram de chegar em uma unidade

Crítica: “Como se trabalha sem condições logísticas? Nem equipamentos adequados para exercer nossa profissão possuímos. É impossível ir para a rua com esta defasagem de material”.

- O índice de criminalidade aumenta em determinado setor

Crítica: “A chefia pouco se importa com o crime – só que saber de promoções, salários e política. Quem acaba pagando o pato é a população”.

- Um projeto de redução de criminalidade é implantado

Crítica: “Quem não vê que essas medidas não funcionam? Isso é estratégia para aparecer, fingir que está fazendo algo de importante, só para figurar bem politicamente”.


É claro que, isoladamente, cada situação das descritas acima pode ocorrer. O problema é que algumas delas são contraditórias em relação às demais. Mas, pasmem, há quem defenda no mesmo dia, ou hora, teses semelhantemente opostas. A intenção? Simplesmente manifestar uma espécie de revolta acrítica contra a organização policial que serve. Qual vantagem ou lucro se ganha com isto: apenas mais atraso.

Autor: Danillo Ferreira - Tenente da Polícia Militar da Bahia, associado ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública e graduando em Filosofia pela UEFS-BA.

 

Diário de PM/BM

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