Há entre os
policiais um tipo de comportamento pessimista quase patológico: qualquer
momento em que se analise determinada medida ou acontecimento, este tipo de
policial se dedica a negativar o objeto de análise, sempre se posicionando
contrariamente, atuando como uma espécie de crítico ácido e voraz na
deslegitimação da mudança proposta. Esta conduta é exercida como uma espécie de
originalidade de pensamento e reflexão. Ser opositor, sempre, é o modo de estar
sempre certo, já que em qualquer coisa pode ser indicada alguma falha e/ou
inconsistência.
Alguns
exemplos desse pessimismo compulsivo:
- Um policial é designado para realizar um curso no exterior
Crítica: “Foi designado porque é ‘peixe’. Provavelmente é parente ou amigo de
algum chefe. O curso certamente não será aproveitado porque o interesse do
policial designado é apenas as diárias que receberá da viagem. A polícia não
ganhará nada com este curso”.
- Um policial de outra corporação é designado para realizar um curso no
exterior
Crítica: “Como nossa polícia é atrasada! Enquanto outras corporações estão
mandando seus policiais para se especializarem no exterior, nossa polícia
continua dando passos de tartaruga, sem se preocupar com a formação dos seus
homens”.
- O Policial é designado para realizar um curso
Crítica: “Só me mandaram fazer este curso para depois me obrigarem a fazer
determinado tipo de serviço. Curso desnecessário, que não acrescenta nada à
minha experiência profissional, muitos professores que falam sem conhecimento
de causa. Seria melhor se tivesse quieto, em minha unidade”.
- Um policial comete um crime e é preso
Crítica: “Arbitrariedade, abuso, perseguição. Se fosse alguém ligado à chefia
provavelmente não seria preso. O tratamento seria diferenciado”.
- O policial que cometeu o crime é solto
Crítica: “Foi solto porque é ‘peixe’. Provavelmente tem alguma ligação com a
chefia, que agilizou o processo de soltura”.
- Novos equipamentos chegam em uma unidade
Crítica: “Prefiro trabalhar com o equipamento que tradicionalmente eu trabalho –
não me dá dor de cabeça nem responsabilidade. Não quero correr o risco de me
complicar com estas coisas”.
- Equipamentos demoram de chegar em uma unidade
Crítica: “Como se trabalha sem condições logísticas? Nem equipamentos adequados
para exercer nossa profissão possuímos. É impossível ir para a rua com esta
defasagem de material”.
- O índice de criminalidade aumenta em determinado setor
Crítica: “A chefia pouco se importa com o crime – só que saber de promoções,
salários e política. Quem acaba pagando o pato é a população”.
- Um projeto de redução de criminalidade é implantado
Crítica: “Quem não vê que essas medidas não funcionam? Isso é estratégia para
aparecer, fingir que está fazendo algo de importante, só para figurar bem
politicamente”.
É claro que,
isoladamente, cada situação das descritas acima pode ocorrer. O problema é que
algumas delas são contraditórias em relação às demais. Mas, pasmem, há quem
defenda no mesmo dia, ou hora, teses semelhantemente opostas. A intenção?
Simplesmente manifestar uma espécie de revolta acrítica contra a organização
policial que serve. Qual vantagem ou lucro se ganha com isto: apenas mais
atraso.
Autor:
Danillo
Ferreira - Tenente
da Polícia Militar da Bahia, associado ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública
e graduando em Filosofia pela UEFS-BA.
Diário de PM/BM
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