O Cabo Spencer e o Soldado Tandberg
realizavam radiopatrulhamento rotineiro por um bairro periférico da cidade de
Iômega. Quebrando a tranquilidade, a central de comunicações pediu atenção na rede
de rádio.
- Atenção todos os postos, há cerca de
dez minutos, três indivíduos armados tomaram de assalto um automóvel Peugeot de
cor preta. A vítima está muito assustada e não soube fornecer a placa do
veículo. A suspeita é de que os infratores tenham evadido sentido a cidade de
Iômega.
Poucos segundos após a transmissão da
mensagem da Central, os dois policiais avistaram um Peugeot preto em
deslocamento. Seria uma simples coincidência? Coincidência ou não, era dever
dos policiais abordarem o automóvel; era para isso que eles eram pagos.
Recuperar o veículo violentamente subtraído por indivíduos armados era a missão
que deveria ser cumprida mesmo que com o sacrifício da própria vida; os
policiais não iriam prevaricar. Imediatamente comunicaram o fato na rede, pediram
cobertura e iniciaram o acompanhamento. Mantiveram certa distância do automóvel
até a chegada do reforço. Com a presença de mais uma viatura e, consequentemente,
com supremacia de força e maior segurança, iniciaram os procedimentos de
abordagem veicular. Momento crítico, de alto risco, no qual o policial sente
o organismo ser inundado por altas doses de adrenalina, elevação do batimento
cardíaco, respiração acelerada, vasoconstrição... O confronto parece próximo, e
o que impera é o instinto de sobrevivência. Ligaram os giroflex e as
sirenes, aproximaram do automóvel com ação vigorosa e, pelo megafone da
viatura, Spencer determinou:
- Abordagem policial! Motorista do
Peugeot preto, pare o veículo no acostamento!
O automóvel foi diminuindo lentamente a
velocidade, até parar. Os policiais desembarcaram com rapidez, assumindo
posições táticas em torno das viaturas.
- Atenção ocupantes do veículo, abram
os vidros e coloquem as mãos onde eu possa vê-las! - verbalizou o Cabo Spencer.
Nenhum movimento, porém, ocorreu no interior do automóvel - Abram os vidros e
coloquem as mãos onde eu possa vê-las! - reiterou, dessa vez falando com mais
firmeza e energia.
Um cidadão, com um movimento brusco,
abriu a porta do veículo, desceu, sem colocar as mãos na cabeça, e disse, com
arrogância:
- Que isso! Não precisa disso, não!
Duas viaturas, sirenes... Pra que isso tudo!?
- Cidadão, coloque as mãos na cabeça!
Coloque as mãos na cabeça!
- Eu vou me identificar. Precisa
apontar a arma pra mim, não.
A situação, crítica por natureza, ficou
ainda mais tensa. Qualquer movimento suspeito e os policiais poderiam atirar em
legítima defesa putativa. O cidadão não compreendia os riscos que corria e
continuou insubmisso.
- Abaixem as armas que eu não sou
vagabundo, não.
- Cidadão, fique calmo e coloque as
mãos na cabeça, para sua própria segurança. E não faça nenhum movimento brusco.
Contrariado, o cidadão obedeceu. Agora
era trazê-lo para área de segurança.
- Cidadão, caminhe em direção da minha
viatura, lentamente, e com as mãos na cabeça.
- Ah, não! Vocês já estão
esculachando... Eu tô com minha esposa no carro. Eu não sou bandido, não. Pára
com isso. Eu sou advogado, eu sei das minhas prerrogativas e dos meus direitos.
- Cidadão, caminhe em direção da minha
viatura, devagar, e com as mãos na cabeça.
Spencer evitou entrar em bate-boca com
o suspeito. Este, insatisfeito e se sentindo molestado, atendeu às
determinações e caminhou até perto da viatura, onde o Soldado Tandberg iniciou
a busca pessoal.
- Que isto, polícia, eu vou me
identificar. Vou pegar minha carteira de advogado. Não precisa disso não que eu
não sou bandido.
- Continua com a mão na cabeça!
Continua com a mão na cabeça! Alguém aqui tá falando que você é bandido...?
Quem mais está no carro?
- Só a minha esposa. Olha os braços dela
lá pra fora da janela...
As informações do suspeito pareciam
consistentes e verossímeis, mas o Cabo Spencer não seria tolo de se aproximar
do carro, invadindo a área de risco pelas simples declarações de um indivíduo
desconhecido. Da mesma forma como fez com o motorista, determinou que a mulher
desembarcasse com as mãos na cabeça. Ela obedeceu e, procurando ganhar
confiança dos policiais, disse:
- Podem ficar tranquilos. Eu sou
psicóloga e sou amiga pessoal do prefeito da cidade.
- A senhora também pode ficar tranquila.
Nós somos profissionais e todos os procedimentos adotados são para sua
segurança e do seu marido. Não faça nenhum movimento brusco, obedeça aos
comandos verbais e não se sinta constrangida.
- Tá bom, mas não precisa apontar a
arma pra mim, não.
- Senhora, eu não te conheço. Continue
com as mãos na cabeça e só fale quando eu lhe perguntar.
- Aí você já está me ofendendo... Você
vai me proibir de falar, é?
- Senhora, caminhe em direção da minha
viatura. Se a senhora colaborar, tudo vai acabar rápido e bem.
- Tá bom, mas não precisa apontar a
arma pra mim, não.
Os policiais continuaram empunhando as
armas na posição de pronta resposta e, com a devida segurança e dentro das
técnicas policiais, a mulher foi abordada. Em seguida, o carro foi revistado e,
por fim, foi constatado que não era o automóvel tomado de assalto. Fora uma
simples coincidência, mas os policias não podiam prevaricar, nem se omitir, nem
menosprezar os riscos, nem desprezar a técnica.
A abordagem policial se somou a grande maioria das
bem-sucedidas, mas que, por pouco, não acabou numa tragédia pela incompreensão
de pessoas que clamam por segurança, mas que não querem ser incomodadas; por
pessoas arrogantes, insubmissas e não cooperativas com o trabalho policial; por
pessoas que cobram proteção do Estado, mas que esquecem que segurança pública
também é responsabilidade de todos.
Autor: José Ricardo
Nota: Esta é uma obra de ficção. Qualquer
semelhança com fatos reais é mera coincidência.
"É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” - Inciso IX do artigo 5º da Constituição Federal.
O que vemos hoje em dia, é que apesar de termos uma classe mais estudada, elas não se comportam educadamente durante uma abordagem policial, mais digo, são elas as que mais reclamam da falta de policiamento.
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