Hoje são histórias tristes, demonstram o
quanto o policial militar realmente cumpre o juramento que fez ao final de sua
formatura no curso de soldado:
“Cumprir rigorosamente as ordens das
autoridades a que estiver subordinado e dedicar inteiramente ao serviço
policial militar, à manutenção da ordem pública e à segurança da comunidade,
mesmo com o risco da própria vida”
Estas são histórias de policiais que viveram
pela Pátria! Morreram sem razão, até quando isto continuará acontecendo?
Eles puseram a vida em risco e morreram
patrulhando as ruas de São Paulo. Para suas famílias, o desafio é descobrir
como seguir em frente.
Armados com metralhadoras e
fuzis, quinze integrantes de uma quadrilha roubaram um banco em Guarulhos às 14
horas do último dia 7. Uma troca de tiros começou na saída da agência e os
bandidos escaparam em cinco carros, dando início a uma perseguição cinematográfica
que envolveu dezenas de viaturas policiais.
Os fugitivos seguiram em direção
à Zona Norte da capital e, em questão de minutos, chegaram às ruas do Tremembé,
bairro monitorado pelo soldado Ailton Tadeu Lamas havia 22 anos. Durante o
cerco, ele encontrou dois bandidos que tentavam invadir uma casa e houve
confronto.
Lamas feriu um deles, mas acabou
atingido por disparos de AR-15 e morreu ao chegar ao Hospital da Polícia
Militar, no Tucuruvi. Vinte e quatro horas depois, três salvas de sete tiros de
festim iniciaram a cerimônia no mausoléu Os Heróis da Polícia Militar, no
Cemitério do Araçá. Após o discurso do comandante do 43º Batalhão da PM (a
unidade de Lamas), veio a bênção do capelão da corporação. Até então estendida
sobre o caixão, a bandeira do Brasil foi dobrada e entregue pelo secretário da
Segurança Pública, Ronaldo Marzagão, a Eliane Soares Lamas, mulher do soldado.
No instante seguinte, o clarim
soou o toque de silêncio. Lamas foi o 272º homem enterrado com honras militares
no mausoléu, criado em 1969 em homenagem aos policiais mortos em serviço. As
perdas contabilizadas, no entanto, são maiores, já que algumas famílias de PMs
dispensam as honrarias e optam por funerais restritos aos parentes e amigos.
Dos 49 policiais militares assassinados entre janeiro
e setembro deste ano na capital, nove estavam a trabalho. Em 2007, foram treze
mortes nas mesmas circunstâncias, um índice menor, por exemplo, que o
registrado no Rio de Janeiro (23 mortes). "Esse número ainda pode ser
reduzido pela metade", avalia o coronel José Vicente da Silva Filho,
ex-secretário nacional de Segurança Pública. Na cidade de Nova York, o
departamento de polícia somou seis mortes no ano passado.
Por Lamas ser uma figura popular entre os 22 000
policiais militares em atividade na capital (são 93 000 no estado), sua morte
chocou os colegas. Conhecido como o "parteiro da PM", chegou a ser
homenageado por ter ajudado no nascimento de catorze bebês. No mês passado,
auxiliou o parto da menina Ana Carolina, a 15ª criança, em uma casa humilde no
Tremembé. "Ele dizia estar preparado para dar a vida pelo seu
trabalho", lembra a viúva, Eliane, mãe de Átilas, de 20 anos, e Aline, de
13. Apesar de poder contar com pensão vitalícia de 1 600 reais, correspondente
ao salário integral de Lamas, a dona-de-casa vai ter seu orçamento reduzido, já
que o soldado complementava a renda familiar como segurança na farmácia do
bairro - estima-se que metade dos PMs da cidade faça bicos.
Mesmo com os baixos rendimentos (o piso salarial de um
soldado em início de carreira é de 1 240 reais, sem contar os adicionais))e a
árdua rotina, os homens e as mulheres de farda se colocam diariamente na linha
de fogo entre a sociedade e os criminosos.
A possibilidade de um enfrentamento nas ruas é grande
e desperta apreensão. Apenas neste ano, 153 policiais saíram feridos antes do
encerramento do expediente. Para a família dos policiais mortos há uma
indenização de 100 000 reais, independentemente da patente. É comum os que
sofrem algum tipo de lesão após uma ocorrência também reivindicarem
indenizações.
Das 102 concedidas desde o início do ano, um gasto de
2,6 milhões de reais para os cofres do governo, 89 beneficiaram profissionais
feridos. "A seguradora calcula o valor a ser pago de acordo com a
gravidade da lesão apresentada no laudo médico", explica o capitão Cássio
Roberto Ferraz, do Centro de Assistência Social e Jurídica da Polícia Militar.
O pagamento das indenizações por morte, de acordo com
a PM, é efetuado em três meses. O comerciante Eliel Alves da Silva, de 22 anos,
filho da soldado Ana Helena Bueno de Paula, do Comando de Policiamento
Rodoviário, esperou bem mais.
Sua mãe morreu em janeiro na Rodovia Anchieta durante
uma ronda. A motocicleta da ex-integrante do Batalhão de Choque foi atingida
por uma carreta que descia a serra. Sem dinheiro para pagar a faculdade de
publicidade, ele abandonou os estudos. Recém-inaugurou uma lanchonete no
Tatuapé com os 50 000 reais recebidos de indenização (a outra metade foi para
sua irmã mais velha).
"Fiquei completamente perdido com a ausência da
minha mãe", diz ele. "Agora espero ganhar dinheiro suficiente para
voltar a pagar minha faculdade e retomar a minha vida."
Além de terem de lidar com o sofrimento da perda dos
entes queridos, os familiares precisam administrar essas questões burocráticas.
O soldado Leandro Martins de Matos, do 25º Batalhão, em Ita-pe-cerica da Serra,
ajudava nas contas de casa.
Com três anos de polícia, o rapaz morava com a mãe,
Maria Divina Batista, em Gua-rapiranga. "Quando vi uma viatura parar na
frente da minha casa, entrei em choque", recorda ela. Naquela manhã de
domingo, em maio do ano passado, Divina soube que o filho fora baleado ao intervir
em uma briga durante um rodeio realizado na região de seu batalhão. Sete meses
após a morte do soldado, ela recebeu os tais 100 000 reais.
Para ter garantida a pensão, precisaria comprovar que
era dependente do filho. "Não há uma declaração provando que o Leandro
pagava as despesas da casa porque ele não planejava morrer", reclama ela,
que tem crises diárias de choro. "Não desejo essa dor nem para a mãe do
assassino do meu filho."
O sargento Marcos Rodrigues Ruiz enfrenta o mesmo
vazio. Tenta se adaptar à ausência do filho de criação Edson Francisco de Lima
Júnior, soldado do 22º Batalhão da PM, morto aos 22 anos após uma troca de
tiros dentro de uma favela no Jardim Miriam, em julho.
Estava ali numa blitz para identificar traficantes de
drogas quando sua equipe foi atacada pelos bandidos. Lima Júnior levou dois
tiros, um no pescoço e outro na perna direita. O soldado ficou em coma por
vinte dias, mas não resistiu. Emocionado, Ruiz conta que chegou a sugerir ao
filho que entrasse para o Corpo Musical da Polícia Militar, já que desde cedo
ensinou trompete ao garoto.
Não convenceu. "Imagine que o sonho dele era ser
policial da Rota."
O soldado Ricardo Vinicius Bueno Martins, do 11º
Batalhão da PM, também tinha outra aptidão, mas preferiu seguir carreira
militar. Era um talentoso jogador de rúgbi. Chegou a disputar partidas pela
Seleção Brasileira Juvenil da modalidade. Em maio do ano passado, quando ia
para a residência dos pais, levou um tiro na cabeça ao tentar interromper um
assalto na Praça da Sé - também é considerado morte em serviço quando o
policial está indo ou voltando para casa. Tinha 25 anos.
"Estávamos sempre juntos, dentro e fora de
campo", diz o irmão Fernando, um ano mais novo. Na cerimônia no Cemitério
do Araçá, a família distribuiu aos amigos um folheto com trechos de uma oração
conhecida entre os patrulheiros da PM: "Dai-me, Senhor, tua graça para que
eu possa honrar minha farda e renovar diariamente perante Vós o juramento de
defender a sociedade, mesmo com o sacrifício da própria vida".
Quatro tiros de fuzil no policial parteiro
Era noite do dia 4 de outubro. Ao parar em frente à
residência na Rua Bitencourt da Silva, no Tremembé, o soldado Ailton Tadeu
Lamas desceu apressado da viatura com sua maleta de primeiros socorros. Deitada
na cama, a dona de casa Laudicéia Santos já ouvia o choro de sua filha Ana
Carolina, que acabara de nascer.
Lamas chegou a tempo de cortar o cordão umbilical e
embalar a pequena em um lençol branco. "Ele levou a menina rapidamente
para o Hospital do Mandaqui", lembra a mãe. Emocionado, o soldado
comemorou em casa com a mulher, Eliane, a participação no 15º parto em 22 anos
de carreira na Polícia Militar.
"Ele preferia sempre trabalhar na rua e gostava
de conversar com as pessoas", conta Eliane. Um mês depois do nascimento de
Ana Carolina, outra ocorrência, também no Tremembé, despertou-lhe preocupação.
Pelo rádio, soube que uma quadrilha havia roubado um banco em Guarulhos e
seguia para a Zona Norte. Ao chegar à Rua Alberto Pierrotti, encontrou dois
integrantes do bando invadindo uma casa.
Ele e seu parceiro trocaram tiros com os bandidos. Um
foi atingido e o outro reagiu com disparos de fuzil AR-15. Lamas tomou quatro
tiros, um deles no tórax. Foi socorrido, mas morreu ao chegar ao Hospital da
Polícia Militar.
Separados por tragédia na Anchieta
Ana Helena Bueno de Paula gostava de dirigir. Em vinte
anos de carreira na Polícia Militar, recebeu elogios pela perícia sobre duas ou
quatro rodas. Conduziu viaturas quando esteve no Batalhão de Choque e, desde
2004, circulava nas motocicletas do Comando de Policiamento Rodoviário
monitorando o trânsito nas estradas. Em janeiro, ela descia a pista sul da
Anchieta quando foi atingida por uma carreta. Morreu na hora.
"Soube por telefone do acidente ocorrido com
minha mãe", lembra Eliel Alves da Silva, que passava férias em Peruíbe, no
Litoral Sul. Ao voltar a São Paulo, ele encontrou o trânsito parado na
Anchieta. "Ali tive um pressentimento ruim", conta Silva. O rapaz de
22 anos aprendeu a gostar de motos com a mãe. "Nós sempre andávamos
juntos."
Com a ausência de Ana Helena, ele deixou a casa
alugada onde moravam e abandonou o curso de publicidade por falta de dinheiro.
Só agora está conseguindo se recuperar. Usou metade da indenização de 100 000
reais recebida oito meses depois da morte de Ana Helena para montar uma
lanchonete no Tatuapé. A outra parte ficou com a irmã, já casada, que vive fora
do Brasil. "Espero ganhar dinheiro para voltar a es-tudar." Por ser
maior de 21 anos, ele não tem direito a pensão.
Orquestra da PM? Não, ele queria a Rota
Há quatro meses, o trompete do sargento Marcos
Rodrigues Ruiz está guardado. Com os olhos marejados, ele conta que ensinou seu
filho de criação, ainda menino, a tirar as primeiras notas no instrumento. Após
alguns anos, Edson Francisco de Lima Júnior montou uma banda e fez shows na
noite paulistana até decidir ser policial. Em julho, já como soldado do 22º
Batalhão da PM, na Zona Sul, o rapaz de 22 anos foi atingido em uma troca de
tiros no Jardim Miriam.
Numa blitz para prender traficantes, ele foi atacado
por bandidos no acesso a uma favela. Lima Júnior levou dois tiros, um no
pescoço e outro na perna direita. "Ele chegou consciente ao hospital, mas
a situação foi se agravando", afirma Ruiz. O soldado morreu depois de
vinte dias em coma. Apesar da perda, o pai reconhece que o filho estava feliz
por ter a oportunidade de patrulhar as ruas. "Cheguei a sugerir que ele
entrasse para o Corpo Musical da Polícia Militar", diz. "Só que o
sonho dele era ser policial da Rota."
Crises diárias de choro
Quando viu a viatura parar em frente à sua residência,
naquele domingo de maio, em 2007, a dona-de-casa Maria Divina Batista ficou em
estado de choque. "Comecei a gritar antes mesmo de ouvir o que o oficial
tinha a dizer", conta. O militar perguntou se ela era a mãe do soldado
Leandro Martins de Matos e informou que o rapaz fora baleado em uma operação.
"Senti naquele momento que meu filho estava morto."
Chegando ao hospital, recebeu a confirmação do médico
e pediu para ver o corpo. "Ao fazer um carinho em sua cabeça, descobri o
ferimento", lembra, com lágrimas nos olhos. "Não consigo esquecer
essa imagem." Martins, que estava na polícia havia três anos, foi baleado
com um tiro na nuca ao intervir em uma briga entre os freqüentadores de um rodeio
no município de Itapecerica da Serra, região do 25º Batalhão.
O rapaz, de 22 anos, morava com a mãe e dois irmãos em
Guarapiranga, na Zona Sul. Maria Divina entrou em depressão e passou a ter
crises diárias de choro. "Não desejo essa dor nem para a mãe do assassino
do meu filho."
Tiro na cabeça ao tentar impedir assalto
Em São Paulo, Ricardo Vinicius Bueno Martins
trabalhava como soldado no 11º Batalhão, no Centro. Nos dias de folga,
costumava voltar a São José dos Campos para assumir o posto na equipe de rúgbi
da cidade, ao lado de seus colegas de infância. Com alguns deles, Martins jogou
inclusive na seleção brasileira juvenil da modalidade.
Ele começou a praticar o esporte em 1997 e acabou
levando ao campo o irmão Fernando, companheiro em muitos jogos pela equipe de
São José. Em 26 de maio do ano passado, Martins saiu do batalhão logo pela
manhã planejando ir à rodoviária do Tietê. Pretendia pegar um ônibus para
chegar ao jogo marcado no período da tarde. Na Praça da Sé, a poucos metros da
estação do metrô, ele presenciou um assalto a uma lanchonete.
Deu voz de prisão ao ladrão, que reagiu sacando a
arma. Martins atirou antes e acertou o bandido. Porém, outro assaltante surgiu
por trás e fez um disparo, atingindo o policial na lateral do colete à prova de
balas. Ao cair ajoelhado, Martins recebeu um tiro na cabeça. No hospital, ele
ainda resistiu em coma por onze dias. A bandeira entregue à mãe no mausoléu da
PM passou para as mãos do irmão Fernando. "Neste ano fui campeão
sul-americano jogando pela seleção brasileira e a bandeira hasteada na hora do
hino foi a dele."
Dezesseis concursos até entrar na PM
Marcos Marcelino de Oliveira era persistente. Queria
ser policial, mas tinha dificuldade de conseguir aprovação nos exames de
admissão. "Ele chegou a fazer dezesseis vezes a prova, até passar",
conta a vendedora de carros Ângela Araújo Marcelino. Nos fins de semana,
Oliveira costumava cuidar dos três filhos (o mais velho, de 8 anos) enquanto a
mulher realizava os plantões de venda na concessionária de veículos.
"As crianças sentem muito a falta do pai."
Quando finalmente foi aprovado no concurso, em fevereiro de 2006, com direito a
festa organizada por Ângela, assumiu o posto de soldado no 5º Batalhão da PM,
no Parque Novo Mundo. Permaneceu ali até a sexta-feira 18 de julho. Durante a
madrugada, a patrulha de Oliveira identificou um veículo suspeito na Rua
Alfredo Borges Teixeira, no Jardim Guancã, na Zona Norte.
O soldado decidiu revistar um homem parado na rua, ao
lado do carro, mas não encontrou nada errado. Instantes depois, dois comparsas
abriram a porta e saíram atirando. Oliveira foi atingido por quatro disparos de
fuzil, um deles no abdômen, e morreu no local. Seu parceiro na viatura
conseguiu escapar.
"Sempre me lembro do meu pai como um herói"
Desde pequena, um dos passeios favoritos de Laura de
Lima Neves era visitar o quartel do Corpo de Bombeiros ao lado do pai, o
sargento Luiz Marcelo da Silva Neves. "Adorava ir às festas e brincar
dentro dos carros", conta. No dia 12 de junho de 2003, a menina viu o
veículo vermelho parar na frente de casa. Por um instante, Isabel Cristina, mãe
de Laura, pensou que o marido havia chegado para fazer uma rápida visita
durante o expediente. Ao atender a campainha, ouviu de um outro bombeiro a
notícia do acidente com Neves. "Se um policial bate à sua porta, algo
grave aconteceu", diz Isabel Cristina.
Horas antes, houve um incêndio em uma fábrica desativada
e, durante o combate ao fogo dentro da instalação, o sargento caiu no fosso do
elevador e morreu no local. Na semana passada, Laura voltou ao 1º Grupamento do
Corpo de Bombeiros, no Cambuci, e posou para a foto diante do caminhão batizado
em homenagem a seu pai.
Diário
de PM/BM
Infelizmente, a maioria das pessoas desconheçe histórias como essas. Histórias de dor e sofrimento, de homens e mulheres que não são super-heróis, mas pessoas normais com o desejo de servir e proteger ao próximo..
ResponderExcluirParabéns pelo texto.