A arma que mata está com o criminoso. (Parte 3)
Essa é a terceira e mais longa parte do artigo
"A arma que mata está com o criminoso." Por essa razão, pede-se que o
leitor tenha paciência e tempo suficientes para a leitura do texto.
Um levantamento citado no recém-lançado Mapa da
Violência 2013 - Mortes Matadas por Armas de Fogo1 (uma compilação
sobre a mortalidade por armas de fogo entre os anos de 1980 e 2010) demonstra o
seguinte:
"Segundo estimativas realizadas por Dreyfus e
Nascimento4, na última década o país contava com um vasto arsenal de
armas de fogo:
· 15,2 milhões em
mãos privadas;
· 6,8 registradas;
· 8,5 não
registradas;
· Dentre elas 3,8
milhões em mãos criminais".
Contudo, outra pesquisa realizada também por Dreyfus
e Nascimento2 (2010) informa o seguinte sobre as armas no Brasil
· 14.408.226 de
armas estão em circulação;
· 3.688.506 são
registradas;
· 10.719.720 não
registradas, das quais 1.219.873 foram destruídas ou entregues durante a
companha do desarmamento;
· Sobraram 9.499.847
de armas não registradas;
· Dentre elas
5.256.079 estão nas mãos de criminosos.
Para alcançarem esses números os pesquisadores da
ONG Viva Rio utilizaram algumas informações, dentre elas, o banco de dados da
Polícia Civil do Rio de Janeiro referente as armas registradas e as
apreendidas. Feito um cruzamento entre essas categorias, os pesquisadores
concluiram que das armas apreendidas, 25,6% eram registradas. Eles também
consideraram que as armas apreendidas representavam o universo de TODAS as armas em
circulação. Os cálculos realizados nesse estudo podem ser verificados na página
102 do relatório Small Arms in Brazil: Production, Trade, and
Holding disponível no endereço http://www.smallarmssurvey.org/fileadmin/docs/C-Special-reports/SAS-SR11-Small-Arms-in-Brazil.pdf.
Para produzirem essas estimativas, os pesquisadores informaram a ausência de
estatísticas oficiais sobre armas de fogo não registradas.
Grosso modo, pode-se concluir que a política
desarmamentista só conseguiu registrar apenas 25,6% das armas curtas dos
cidadãos e manter 66% sem qualquer conhecimento e controle. Apesar de 25,6% das
armas apreendidas possuírem registro, isso não significa que foram os
proprietários legítimos os responsáveis pelos crimes cometidos com essas armas.
Quer dizer, em algum momento da história de cada arma apreendida houve um
registro formal da sua existência/propriedade. Isso implica afirmar que o
arsenal nas mãos criminosas pode ultrapassar 5.256.079 de unidades. Isso sem
contar as armas "importadas".
Ainda bem que o Mapa da Violência utilizou o termo
"estimativas", pois o Serviço de Informação ao Cidadão da PF3 informou que
atualmente existem cerca de 1.850.000 de armas com registro válido no Brasil.
Se a estimativa não consegue informar o número correto de armas registradas,
então é possível afirmar que os números carecem de credibilidade. Mas o pior é ESTIMAR TODO O
UNIVERSO de armas registradas, não registradas e aquelas que
estão nas mãos de criminosos com base em armas apreendidas. Em razão do
desencontro dos dados estatísticos é possível até afirmar que o cenário não
seja tão caótico como pode parecer no que diz respeito à quantidade de armas de
fogo empregadas em ações violentas. Mas uma coisa é certa: a violência não
possui relação simplesmente com a arma de fogo, mas principalmente com a
mentalidade criminosa e a benevolência estatal com que são tratados os bandidos
brasileiros.
Se isso não fosse o suficiente, o portal da
Campanha Nacional do Desarmamento, na seção Perguntas e Respostas, diz:
"Desarmar a população não vai aumentar a
insegurança nas ruas? Pelo contrário. A POPULAÇÃO FICARÁ
AINDA MAIS SEGURA. Dados oficiais mostram que 80% DOS CRIMES ocorridos no
Brasil são REALIZADOS COM ARMAS ADQUIRIDAS LEGALMENTE." (Grifo
nosso).
Então, na visão governamental a maioria das mortes
violentas causas por armas de fogo é o resultado do uso indevido de 3.688.506
armas registradas por cidadãos brasileiros. E apenas 20% das mortes são
provocadas pelas 9.499.847 armas não registradas, das quais 5.256.079 estão nas
mãos de criminosos. Fala sério!
Contudo, o estudo elaborado pela ONG Viva Rio
informa que das armas apreendidas pela polícia, APENAS 25,6% SÃO
REGISTRADAS, ou seja, ADQUIRIDAS LEGALMENTE.
O sumário do capítulo 2 do Small Arms
Survey 20074 esclarece a questão das estatísticas sobre armas no
mundo:
"Não existe nenhuma técnica científica que
possa assegurar com certeza quantas armas existem em posse dos civis no mundo.
Os dados do Small Arms Survey por país foram reunidos usando numerosas fontes e
métodos. Sempre que possível, esses números são baseados em registros oficiais
e em estimativas independentes usadas para uma melhor compreensão. As
estatísticas oficiais sobre registros de armas são a fonte mais confiável de
informações, mas contam apenas uma parte da história. Quando nem dados
oficiais, nem independentes estão disponíveis, as estimativas são baseadas em
análises estatísticas correlatas. A fontes mais confiáveis de informação são as
mais utilizadas; os métodos menos confiáveis são introduzidos à medida que se
torna necessário assegurar resultados mais completos."
Infelizmente, o conceito do desarmamento paira
sobre a ideia de que menos armas significam menos mortes. O Mapa da Violência
2013 informa o seguinte em relação a idade, sexo e raça/cor da vítimas:
"[...] ao analisar a evolução da mortalidade
por armas de fogo no período de 1980 a 2010, o crescimento da mortalidade entre
os joves foi bem mais intenso que no resto da população. Se para todas as
idades os números cresceram 346,5% ao longo do período, entre os jovens esse
crescimento foi de 414,0%. Também os homicídios juvenis cresceram de forma mais
acelerada: na população total foi de 502,8%, mas entre os jovens o aumento foi
de 591,5%. Esse fenômeno pode ser melhor interpretado se
dividirmos a população total em dois grandes grupos: os jovens – população na
faixa de 15 a 29 anos de idade – e os não jovens, o resto da
população (isto é, tanto aqueles com menos de 15 anos, quanto os com idade acima
de 29 anos)." (p. 33).
"Pode ser vista a enorme concentração de
mortalidade nas idades jovens, com pico nos 21 anos de idade, quando os óbitos
por AF (armas de fogo) atingem a impressionante marca de 56,4 mortes por 100
mil jovens nessa idade." (p. 34)
"Outra característica que os registros do SIM
permitem verificar é a raça/cor das vítimas. Vemos na tabela 6.4 que as taxas
de homicídio da população preta - 19,7 óbitos para cada 100 mil pretos - são
88,4% maiores que as taxa brancas - 10,5 óbitos para cada 100 mil brancos. Isto
é, morrem, proporcionalmente, 88,4% mais pretos que brancos. Já as taxas de
óbitos por AF dos pardos são 156,3% maiores que a dos brancos." (p. 38).
Porém, a legislação brasileira sobre armas de fogo
informa que o interessado em adquirir, registrar ou portar uma arma deve ter,
no mínimo, 25 anos de idade. Curiosamente, essa é a idade em que o Mapa da
Violência 2013 informa a diminuição gradual na taxa de mortalidade por AF e
idades simples.
Um estudo do IBGE5 informou que
dentre as pessoas ocupadas no Brasil em 2010, os amarelos e os brancos
detiveram salários médios 37,6% e 26,9% ACIMA da média. Os
pardos e negros receberam salários 29% e 31,3% ABAIXO da média nacional.
Assim, pode-se deduzir que, em razão do alto custo para aquisição, registro e
porte de armas de fogo legalizadas, a posse dessas armas seja maior entre os
brancos do que entre os negros e pardos. Desse modo, DEVERIA SER
VERIFICADA UMA TAXA DE HOMICÍDIOS MAIOR ENTRE ADULTOS, BRANCOS E COM RENDA
ACIMA DA MÉDIA NACIONAL. MAS ESSA TAXA É MAIOR ENTRE OS JOVENS NEGROS E
PARDOS, conforme
comprova o Mapa da Violência 2013. Logo, não são as armas legalizadas que estão
matando, mas aquelas não registradas, ilegais e nas mãos criminais. Exatamente
as armas de fogo que o rigor da legislação não consegue identificar e controlar.
O estudo Small Arms Survey
2007, no capítulo 7,
Mapeando um país dividido: Violência por armas de fogo e urbanização no Brasil
(p. 9) declara haver determinantes para os homicídios por AF no Brasil, ou seja,
os fatores de risco. São eles:
· Densidade
demográfica: "Em regra geral, quanto maior o número de habitantes por km2,
mais alta a taxa de homicídios por arma de fogo em um dado município. O tamanho
da população, que, em muitos casos, é um indicador importante, não é tão
forte." (p.10);
· Desigualdade:
"a desigualdade é um fator importante para os homicídios por arma de fogo
no Brasil". Nesse caso a desigualdade se refere à distribuição de renda;
· A proporção jovem
na população;
· Jovens fora da
escola e que não trabalham;
· Famílias
vulneráveis: "família uniparental chefiada por mulher, com filhos menores
de 21 anos que não trabalham. Os resultados são inequívocos, e indicam uma
estrutura familiar que provavelmente reproduz as condições de desigualdade,
gerando crianças e jovens muito expostos à violência por arma de fogo."
(p. 11);
· Existência de
armas de fogo no domicílio
Então, é possível que jovens que não estudam ou
trabalham, que vivem em aglomerados ou bairros populosos, sob o "cuidado"
de uma família desestruturada e de baixa renda tenham condições de adquirir
armas de fogo registradas no mercado lícito? Ou essas são as características
básicas dos criminosos juvenis que portam armas sem registro para cometerem
crimes?
Para perceber que a concessão de portes de armas de
fogo não possui relação com as taxas de homicídios, basta analisar a quantidade
expedida de portes de armas pela PF entre os anos de 2007 e 2012 com a variação
percentual do número de óbitos entre os anos de 2006 e 2010.
Região
|
Portes concedidos
(2007/2012)
|
Variação - nº de óbitos
(2006/2010)
|
Variação - taxa de óbito -
100 mil habitantes
(2006/2010)
|
Ordem segundo taxas e nº de
homicídios por AF
(2006/2010)
|
Ordem segundo concessão de
portes de armas
(2007/2012)
|
Norte
|
626
|
+61,40%
|
+53,3%
|
1º
|
5º
|
Nordeste
|
1.649
|
+34%
|
+30,23%
|
2º
|
4º
|
Centro-Oeste
|
3.022
|
+18,95%
|
+12,36%
|
3°
|
3º
|
Sul
|
5.335
|
+10,20%
|
+10,17%
|
4°
|
2º
|
Sudeste
|
21.433
|
-27,97%
|
-28,90%
|
5º
|
1º
|
Fontes: PF e Mapa da Violência 2010
Avaliando a tabela, fica claro que não existe
relação entre o aumento de armas legalizadas e portadas pelos cidadãos com o
aumento do número ou a taxa de homicídios por AF, pois é exatamente o
contrário. Quer dizer, as regiões que mais emitiram autorizações para o porte
de armas registradas são as mesmas que apresentam a menor quantidade de
assassinatos. O caso mais evidente é o Estado de São Paulo, que emitiu 21.433
portes de armas e apresentou um declínio acentuado nas mortes por armas de
fogo. No ano 2000, o Estado de São Paulo ocupava a sexta colocação no
ordenamento segundo as taxas de óbitos, mas em 2010 caiu para a 24º posição.
Isso representou um declínio de 67,5% nas mortes provocadas por armas de fogo
no estado. Portanto, menos armas NÃO significam menos
mortes.
O artigo Salvando Vidas6, publicado no
Correio Braziliense em 03/01/2013, demonstra como os números podem ser
manipulados para provar a tese desarmamentista. Parte do artigo informa:
"Como medir os efeitos do Estatuto e das
medidas associadas a ele? Precisamos de um 'antes' e de um 'depois'. Tomando
por base todos os anos do CID 10, vemos que morreram por PAF 26.481 brasileiros
em 1996; 27.753 em 1997; 30.211 em 1988; 31.198 em 1999; 34.985 em 2000; 37.122
em 2001 e 37.979 em 2002, ano anterior ao Estatuto. As mortes por PAF
aumentaram em mais de 2 mil por ano (2.072) até 2002, inclusive. Sem
modificações como o Estatuto, que previsão poderia ser feita para os anos
posteriores à Lei nº 10.826/2003, seguindo a progressão anterior?SERIAM, DE
2004 A 2010, SUCESSIVAMENTE: 42.123, 44.195, 46.267, 48.339, 50.411 E 54.555.
Devido ao crescimento observado antes do Estatuto, mais de 200 mil brasileiros
seriam mortos pelas armas de fogo." (Salvando Vidas, 2013). (Grifo nosso).
Agora, o artigo foi publicado em 2013, mesmo ano em
que foi publicado o Mapa da Violência, aquele que contempla a análise das
mortes ocorridas de 1980 a 2010. O MAPA DEMONSTRA A
PROGRESSÃO DAS MORTES DE 2004 A 2010, SUCESSIVAMENTE: 37.113, 36.060, 37.360,
36.840, 38.658, 39.677 E 38.892. Então, perceba que o autor do artigo decidiu
realizar uma “projeção” de mortes para majorar os números em benefício do
Estatuto do Desarmamento. Ele decidiuNÃO UTILIZAR OS DADOS CONCRETOS que já estavam
disponíveis e que também foram publicados no Mapa da Violência. Os dados compilados
de 1996 a 2002 são exatamente os mesmos, curiosamente antes do estatuto. O
autor ainda esqueceu-se de informar que a quantidade de mortes foi recorde em
2003, ano de lançamento do estatuto, com 39.325 óbitos. A adivinhação de
possíveis mortes publicada no artigo (de 2004 a 2010) totalizou 338.373 óbitos.
Já os dados verdadeiros somam 264.600. Uma pessoa ingênua poderia supor que a
projeção (338.373) menos o número real (264.600) indicariam o
"salvamento" de 73.773 vidas. Mas essa ideia só possui cabimento
porque os dados verdadeiros foramMAJORADOS para que a
comparação com a realidade demonstrasse algum efeito positivo da ação
desarmamentista. Se o desarmamento fosse realmente eficaz haveria um declínio
real no número de homicídios, ou seja, algo bem abaixo de 264.600 mortes.
Excluindo o ano de 2003, os 7 anos anteriores ao
estatuto (1996 a 2002) somaram 225.729 mortes por armas de fogo. Já os 7 anos
posteriores (2004 a 2010) totalizaram 264.600 óbitos. Ou seja, um aumento real
de 17,22%. O artigo faz crer que o desarmamento seria responsável pelo
salvamente de mais de 200.000 pessoas. Mas na verdade, a entrega de armas de
fogo não salvou uma vida sequer, em números absolutos.
A questão da manipulação e interpretação dogmática
dos dados e a deficiência estatística são tão preocupantes que o próprio Mapa
da Violência informa que "Não se pode negar que as informações do sistema
de óbitos ainda estão sujeitas a uma série de limitações e críticas." (p.
8). E segue:
"A primeira grande limitação, assumida pelo
próprio SIM, é o sub-registro, devido à ocorrência de inúmeros sepultamentos
sem o competente registro, determinando uma redução do número de óbitos
declarados. Não só a quantidade, mas também as qualidades dos dados têm sofrido
reparos: mortes sem assistência médica que impedem a correta indicação das
causas e ou lesões, deficiência no preenchimento adequado da certidão,
etc." (p. 8).
Nesse sentido, é certo afirmar que o número de
vítimas de armas de fogo ultrapasse consideravelmente aquele registrado pelo
Estado. Isso é outro indicativo que campanhas desarmamentistas não são as
estratégias eficazes para a redução dos níveis de violência e criminalidade.
Além disso, todas as mortes registradas e
contabilizadas no Mapa da Violência 2013 incluem “todos aqueles óbitos
acidentais, por agressão intencional de terceiros (homicídios), autoprovocadas
intencionalmente (suicídios) ou de intencionalidade desconhecida, cuja
característica comum foi a morte causada por uma de fogo.” (p. 7).
É possível que as políticas de controle de armas
possam reduzir o número de suicídios por armas de fogo, mas não se provou ainda
que elas sejam capazes de reduzir o risco global de suicídio em qualquer país.
Afinal, suicidas comprometidos com o autoextermínio serão bem sucedidos em
qualquer circunstância (saltando de edifícios e pontes, saltando na frente de
veículos, ingerindo medicamentos, substâncias venenosas ou drogas ilícitas, se
enforcando, e assim por diante). A questão do suicida não é a arma, mas o empenho
em se matar. Portanto, culpar a arma de fogo no caso de mortes autoprovocadas é
outro erro de análise. Já os acidentes são o resultado da imprudência,
negligência ou imperícia, e novamente eles possuem relação com o comportamento
da pessoa e não com a arma de fogo em si. Até policiais e militares em todo o
mundo, acostumados com o manejo de armas de fogo, se envolvem em acidentes de
tiro. Então, resta o que realmente interessa: os homicídios. E para isso basta
mostrar os números absolutos de mortes a partir de 1997 (ano de instituição do
Sistema Nacional de Armas) e os números de mortes por 100 mil habitantes.
Ano
|
Nº de homicídios
(pop. total)
|
Comparação (ano anterior)
|
Nº de homicídios
(pop. jovem)
|
Comparação (ano
anterior)
|
1997
|
24.445
|
*
|
13.680
|
*
|
1998
|
25.674
|
+ 1.229
|
14.643
|
+ 963
|
1999
|
26.902
|
+ 1.228
|
15.475
|
+ 832
|
2000
|
30.865
|
+ 3.963
|
18.252
|
+ 2.777
|
2001
|
33.401
|
+ 2.536
|
19.800
|
+ 1.548
|
2002
|
34.160
|
+ 759
|
20.567
|
+ 767
|
2003
|
36.115
|
+ 1.955
|
21.755
|
+ 1.188
|
2004
|
34.187
|
- 1.928
|
20.827
|
- 928
|
2005
|
33.419
|
- 768
|
20.336
|
- 491
|
2006
|
34.921
|
+ 1.502
|
20.939
|
+ 603
|
2007
|
34.147
|
- 774
|
20.546
|
- 393
|
2008
|
35.676
|
+ 1.529
|
21.475
|
+ 929
|
2009
|
36.624
|
+ 948
|
21.912
|
+ 437
|
2010
|
36.792
|
+ 168
|
21.843
|
- 72
|
Ano
|
Nº de homicídios
(em 100 mil)
|
Comparação (ano anterior)
|
Nº de homicídios
(em 100 mil)
|
Comparação (ano
anterior)
|
1997
|
15.3
|
*
|
30.5
|
*
|
1998
|
15.9
|
+
|
32.2
|
+
|
1999
|
16.4
|
+
|
33.6
|
+
|
2000
|
18.2
|
+
|
38.1
|
+
|
2001
|
19.4
|
+
|
40.7
|
+
|
2002
|
19.6
|
+
|
41.7
|
+
|
2003
|
20.4
|
+
|
43.5
|
+
|
2004
|
19.1
|
-
|
41.1
|
-
|
2005
|
18.1
|
-
|
39.0
|
-
|
2006
|
18.7
|
+
|
39.6
|
+
|
2007
|
18.0
|
-
|
39.1
|
-
|
2008
|
18.8
|
+
|
41.3
|
+
|
2009
|
19.3
|
+
|
42.4
|
+
|
2010
|
19.3
|
=
|
42.5
|
+
|
Fonte: Mapa da Violência 2010
Portanto, a ideia de que menos armas de fogo
representam menos assassinatos não se sustenta, principalmente quando se
considera o aumento da população. A verdade é que, na média, a situação piorou.
Intervalo
|
Média do nº de homicídios
(pop. total)
|
Média do nº de
homicídios (em 100 mil)
|
1997 – 2003
|
30.223
|
17.88
|
2004 - 2010
|
35.109
|
18.75
|
O estudo trás outra informação:
“A evolução ao longo dessas décadas não foi
homogênea. Entre 1990 e 2003 o crescimento foi relativamente sistemático e
regular, com um ritmo muito acelerado: 7,3% ao ano. Depois do pico de 39,3 mil
mortes em 2003, os números, num primeiro momento, caíram para aproximadamente
36 mil, mas depois de 2008 ficam oscilando em torno das 39 mil mortes anuais. O
Estatuto e a Campanha do Desarmamento, que iniciam em 2004, pareceriam ser
fatores de peso na explicação dessa mudança.” (p. 10).
Ora, se o argumento de que “O volume desse
arsenal guarda correspondência com a mortalidade que origina.”, ou seja, menos
armas menos mortes, então era preciso perceber uma redução do número de mortes.
Obviamente, essa redução não ocorre como o próprio estudo afirma:
“Os dados indicam que essas políticas, se
conseguiram sofrear a tendência do crescimento acelerado da mortalidade por
armas de fogo imperante no país, não tiveram suficiente efetividade ou força
para reverter o processo e fazer os números regredirem, como deverá ser analisado
ao longo do estudo.” (p. 12).
A conclusão de que menos armas em circulação,
principalmente as legalizadas, é fator preponderante para a redução das mortes
por armas de fogo pode ser desconstruída com base nos dados apresentados pelo Small Arms Survey
2007 e as estatísticas de homicídios por AF da
Organização das Nações Unidas (ONU) de 20118. O cruzamento dos dados
demonstra que os países com maior quantidade de armas são os que apresentam os
menores índices de homicídios por AF. Os maiores níveis de mortes são
apresentados nos países com menores quantidades de armas (Colômbia, BRASIL, África do Sul e
Filipinas).
País
|
Armas por 100 mil habitantes
(2007)
|
Homicídios por
AF por 100 habitantes (ONU)
|
Estados Unidos
|
90
|
3.2 (2010)
|
Iêmen
|
61
|
-
|
Finlândia
|
56
|
0.4 (2009)
|
Suíça
|
46
|
0.8 (2004)
|
Iraque
|
39
|
-
|
Sérvia
|
38
|
0.5 (2009)
|
França
|
32
|
0.1 (2007)
|
Canadá
|
31
|
0.5 (2009)
|
Suécia
|
31
|
0.4 (2004)
|
Áustria
|
31
|
0.2 (2006)
|
Alemanha
|
30
|
0.2 (2010)
|
Arábia Saudita
|
26
|
0.3 (2008)
|
Grécia
|
23
|
0.3 (2006)
|
Angola
|
21
|
-
|
Tailândia
|
16
|
5.0 (2006)
|
Austrália
|
15
|
0.1 (2009)
|
México
|
15
|
10 (2010)
|
África do Sul
|
13
|
17.0 (2007)
|
Turquia
|
13
|
0.8 (2006)
|
Argentina
|
13
|
3.0 (2008)
|
Itália
|
12
|
0.7 (2006)
|
Paquistão
|
12
|
-
|
Venezuela
|
11
|
39.0 (2009)
|
Espanha
|
11
|
0.2 (2009)
|
Rússia
|
9
|
-
|
Brasil
|
9
|
18.1 (2008)
|
Colômbia
|
7
|
27.1 (2010)
|
Israel
|
7
|
0.1 (2007)
|
Ucrânia
|
6
|
0.2 (2009)
|
Inglaterra
|
6
|
0.1 (2007)
|
Irã
|
5
|
-
|
Filipinas
|
5
|
8.9 (2003)
|
Índia
|
4
|
0.3 (2009)
|
China
|
3
|
-
|
Nigéria
|
1
|
-
|
Fontes: Small Arms Survey 2007
e Onu
Colômbia, Brasil e África do Sul possuem políticas
desarmamentistas e existem outros países com restrições severas as armas de
fogo, tais como a Venezuela. Porém, o que se observa é uma mortandade elevada
justamente nos países com políticas desarmamentistas, polícias despreparadas e
desmotivadas, sistema de investigação obsoleto, sistema prisional falido,
condescendência para com os criminosos, apatia legislativa, incompetência e
ideologia estatal, dogmatismo de entidades de direitos humanos, etc.
O relatório da ONU denominado Violence, Crime
and Illegal Arms Trafficking in Colômbia7 elaborado pelas
Nações Unidas em 2006 apresenta algumas curiosidades que merecem menção:
“Embora seja possível estabelecer uma correlação
entre as armas curtas e as armas portáteis com o homicídio intencional (a
violência exercida nos contextos de delinquência ou conflito armado), não é
possível estabelecer que as armas de fogo, legais ou ilegais, aumentem ou
promovam a violência.” (p. 9).
[...] a percentagem de armas de fogo envolvidas em
infrações comuns, tais como roubos e assaltos, não é tão elevado como seria de
se esperar. Em uma amostra de 89.278 infrações, apenas 26% delas (23.478) foram
cometidas com armas de fogo. Os crimes em que as armas de fogo são mais utilizadas
são os conflitos por terras (96%) e o roubo de veículos (40%). (p. 14).
“Armas de fogo também não contribuem
significativamente para o suicídio. Dos 1.786 suicídios ocorridos na Colômibia
durante o ano de 2005, apenas 23% foram cometidos com armas de fogo. A taxa
total de suicídio para esse foi de 3.8 por 100 mil. A taxa de suicídios com
armas de fogo foi de 0.9. De uma perspectiva internacional, as taxas de
suicídio são baixas na Colômbia. Na América do Norte, a taxa é de 5.5 e na
Europa Ocidental, 1.7. A forma mais comum de suicídio na Colômbia em 2005 foi o
enforcamento para os homens, e o envenenamento para as mulheres.” (p. 14).
“Os diferentes estudos e projetos de pesquisa que
analisam a relação entre as armas de fogo e a violência são caracterizados pelo
seu alto teor político, ideológico e emocional, independentemente do país em
que são levados a efeito. Isso não é surpreendente, já que as armas de fogo não
apenas involvem interesses econômicos importantes e desempenham um papel
crucial no equilíbrio de poder, mas porque também representam o instrumento que
causa a maioria das mortes e, consequentemente, o maior pesar entre os seres
humanos. Contudo, como apontado no Small Arms Survey, é importante ter em mente
que apesar das armas serem usadas em atos violentos, isso necessariamente não
significa que elas são a causa de tais atos, ou que elas contribuem para o
aumento da violência.” (p. 15).
“A baixa participação das armas de fogo nos crimes
de lesão corporal (3%), suicídios (23%) e crimes comuns (26%), bem como sua
participação acentuada em homicídios (70%) e massacres (90%), indicam que as
armas de fogo na Colômbia não são utilizadas indiscriminadamente pela população
e que uso está restrito a situações muito específicas para o exercício “profissional”
da violência.” (p. 16).
Mas a verdade é simples. É mais fácil para um
governo esconder ou manipular a verdade que "gastar" um tostão que
seja para implantar políticas sérias de segurança pública para proteger o
eleitor inteligente. Para o eleitor burro basta uma propaganda falaciosa e um
bolsa "qualquer coisa". É mais fácil combater você que combater o
bandido!
Na quarta e última parte desse artigo você saberá
por que é grotesco comparar crimes urbanos violentos com situações de guerra.
Humberto Wendling é Agente Especial
da PF, Professor de Armamento e Tiro e Autor do livro Autodefesa Contra o Crime
e a Violência – Um guia para civis e policiais
Fonte 1: Mapa da Violência 2013
Fonte 2: Small Arms in Brazil: Producion, Trade, and Holdings, 2010
Fonte 3: E-mail nº 001/2012-SIC/DIREX/DG/DPF
Fonte 4: Small Arms Survey 2007
Fonte 5:
http://www.fecomercio.com.br/blog/2012/08/10/ibge-confirma-diferencas-significativas-na-renda-media-das-familias-conforme-autodeclaracao-de-raca/
Fonte 6:
http://blog.justica.gov.br/inicio/estatuto-do-desarmamento-salvou-quase-2-mil-vidas-por-ano-diz-artigo/
Fonte 7: United Nations, Office on Drugs and Crime, Crime and Illegal
Arms Trafficking in Colombia, 2006
Fonte 8: United Nations, Office on Drugs and Crime,
Homicides by Firearms, 2012
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